4 leituras essenciais sobre o desaparecimento das florestas tropicais do Brasil

The Conversation

Cerca de 40.000 incêndios estão incinerando a floresta amazônica, a mais recente epidemia em uma temporada de incêndios hiperativos que queimou 2140 quilômetros quadrados da floresta tropical este ano.

Não culpe o clima seco pela rápida destruição da maior floresta tropical do mundo, dizem ambientalistas. Esses incêndios amazônicos são um desastre causado pelo homem, provocado por madeireiros e pecuaristas que usam um método de “cortar e queimar” para limpar a terra. Alimentando-se de condições muito secas, alguns desses incêndios se espalharam fora de controle.

O Brasil tem lutado muito para preservar a Amazônia, às vezes chamada de “pulmão do mundo” porque produz 20% do oxigênio do mundo. Apesar das proteções ambientais cada vez mais rigorosas das últimas décadas, cerca de um quarto desta enorme floresta tropical já desapareceu.

Embora a mudança climática ponha em perigo a Amazônia, trazendo um clima mais quente e secas mais longas, o desenvolvimento pode ser a maior ameaça enfrentada pela floresta tropical.

Aqui, pesquisadores ambientais explicam como a agricultura, grandes projetos de infraestrutura e estradas impulsionam o desmatamento que está lentamente matando a Amazônia.

1. A agricultura na selva

“O desmatamento se deve em grande parte ao desmatamento para fins agrícolas, especialmente na pecuária, mas também na produção de soja”, escreve Rachel Garrett, professora da Universidade de Boston, que estuda o uso da terra no Brasil.

Como os agricultores precisam de “uma quantidade enorme de terra para pasto, e plantio”, diz Garrett, eles são levados a “limpar continuamente a floresta – ilegalmente – para expandir as pastagens”.

Doze por cento do que antes era floresta amazônica – cerca de 93 milhões de acres – são agora terras agrícolas.

Amazonia em chamas
A pecuária é uma das principais indústrias da região amazônica. Imagem: Nacho Doce/Reuters

O desmatamento na Amazônia disparou desde a eleição, no ano passado, do presidente da extrema-direita Jair Bolsonaro. Argumentando que as zonas de conservação federais e as pesadas multas por derrubar árvores impedem o crescimento econômico, Bolsonaro cortou as rígidas normas ambientais do Brasil.

Não há evidência que apoie o ponto de vista de Bolsonaro, diz Garrett.

“A produção de alimentos na Amazônia aumentou substancialmente desde 2004”, diz Garrett.

O aumento da produção tem sido impulsionado por políticas federais destinadas a desencorajar o desmatamento, tais como multas pesadas por desmatamento e empréstimos a juros baixos para investir em práticas agrícolas sustentáveis. Os agricultores estão agora plantando e colhendo duas culturas – principalmente soja e milho – a cada ano, em vez de apenas uma.

Os regulamentos ambientais brasileiros também ajudaram os fazendeiros amazônicos.

A pesquisa de Garrett descobriu que a melhoria do manejo de pastagens em linha com políticas federais de uso da terra mais rígidas levou o número de bovinos abatidos anualmente por acre a dobrar.

“Os agricultores estão produzindo mais carne – e, portanto, ganhando mais dinheiro – com suas terras”, escreve ela.

2. Desenvolvimento de infraestrutura e desmatamento

O presidente Bolsonaro também está impulsionando um ambicioso plano de desenvolvimento de infraestrutura que transformaria os muitos cursos d’água da Amazônia em geradores de eletricidade.

O governo brasileiro há muito tempo quis construir uma série de novas grandes barragens hidrelétricas, inclusive no Rio Tapajós, o único rio não danificado da Amazônia. Mas o povo indígena Munduruku, que vive perto do rio Tapajós, tem se oposto estridentemente a esta idéia.

“Os Munduruku têm até agora desacelerado com sucesso e aparentemente interrompido muitos esforços para lucrar com o Tapajós”, escreve Robert T. Walker, um professor da Universidade da Flórida que tem conduzido pesquisas ambientais na Amazônia por 25 anos.

Mas o governo de Bolsonaro tem menos probabilidade do que seus antecessores de respeitar os direitos indígenas. Um de seus primeiros passos no governo foi transferir as responsabilidades pela demarcação de terras indígenas do Ministério da Justiça do Brasil para o decididamente pró-desenvolvimento do Ministério da Agricultura.

E, observa Walker, os planos de desenvolvimento da Amazônia de Bolsonaro fazem parte de um projeto sul-americano mais amplo, concebido em 2000, para construir uma infraestrutura continental que forneça eletricidade para a industrialização e facilite o comércio em toda a região.

Para a Amazônia brasileira, isso significa não apenas novas barragens, mas também “redes de hidrovias, ferrovias, portos e estradas” que vão colocar produtos como soja, milho e carne bovina no mercado, segundo Walker.

“Este plano é muito mais ambicioso do que projetos de infraestrutura anteriores” que prejudicaram a Amazônia, escreve Walker. Se o plano de Bolsonaro avançar, ele estima que 40% da Amazônia poderá ser desmatada.

3. Cursos de água cobertos por estradas

Estradas, a maior parte delas sujas, já atravessam a Amazônia.

Isso foi uma surpresa para Cecilia Gontijo Leal, uma pesquisadora brasileira que estuda habitats de peixes tropicais.

“Imaginei que o meu trabalho de campo seria apenas passeios de barco em rios imensos e longas caminhadas na selva”, escreve ela. “Na verdade, tudo o que minha equipe de pesquisa precisava era de um carro.

Viajando em estradas de terra batida para coletar amostras de água de córregos no estado do Pará, Leal percebeu que as “pontes” informais dessa rede de transporte construída localmente devem estar impactando as hidrovias da Amazônia. Então, ela decidiu estudar isso também.

“Descobrimos que travessias improvisadas de estradas causam erosão costeira e acúmulo de lodo nos córregos. Isso piora a qualidade da água, prejudicando os peixes que prosperam neste habitat delicadamente equilibrado”, escreve ela.

As passagens rodoviárias mal projetadas – que apresentam escoadouros empoleirados que interrompem o fluxo de água – também atuam como barreiras ao movimento, impedindo que os peixes encontrem lugares para se alimentar, reproduzir-se e se abrigar.

4. Reabilitar as florestas tropicais

Os incêndios que agora consomem grandes extensões da Amazônia são a mais recente repercussão do desenvolvimento na Amazônia.

Os incêndios, provocados por fazendeiros, provavelmente encorajados pela postura anti-conservação do presidente, emitem tanta fumaça que, em 20 de agosto, “apagaram” o sol do meio-dia na cidade de São Paulo, a 2.735 quilômetros de distância. Os incêndios ainda estão se multiplicando, e o pico da estação seca ainda está a um mês de distância.

Amazônia em chamas
Floresta amazônica recentemente queimada por madeireiros e agricultores em Iranduba, estado do Amazonas, 20 de agosto de 2019. Imagem: Reuters/Bruno

Mesmo apocalíptico como isto soa, a ciência sugere que não é tarde demais para salvar a Amazônia.

As florestas tropicais destruídas por incêndios, desmatamentos, desmatamentos e estradas podem ser replantadas, dizem os ecologistas Robin Chazdon e Pedro Brancalion.

Usando imagens de satélite e as mais recentes pesquisas sobre biodiversidade, mudanças climáticas e segurança hídrica, Chazdon e Brancalion identificaram 619.597 quilômetros  quadrados de “hotspots de restauração” – áreas onde a restauração de florestas tropicais seria mais benéfica, menos cara e de menor risco.

“Embora essas florestas de segundo crescimento nunca venham a substituir perfeitamente as florestas mais antigas que foram perdidas”, escreve Chazon, “plantar árvores cuidadosamente selecionadas e ajudar nos processos de recuperação natural pode restaurar muitas de suas antigas propriedades e funções”.

Os cinco países com maior potencial de restauração tropical são Brasil, Indonésia, Índia, Madagascar e Colômbia.

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