Asteroide Ryugu é surpreendentemente seco

SoCientífica
A espaçonave japonesa Hayabusa 2 (cuja sombra é visível no topo da imagem) tirou esta foto do asteroide Ryugu em 22 de fevereiro, cerca de um minuto depois de tocar em sua superfície e depois levantar novamente.

A sonda Hayabusa 2 revela novas pistas sobre os primórdios do sistema solar. O asteroide Ryugu é tão seco que possivelmente teremos que repensar de onde veio a água da Terra.

A Agência de Exploração Aeroespacial do Japão (JAXA) enviou a sonda Hayabusa 2 até o asteroide Ryugu em 03 de dezembro de 2014. Depois de quase um ano pesquisando o Ryugu, a Hayabusa 2 já coletou dados inestimáveis que podem ajudar os cientistas a entender melhor o sistema solar primitivo. Agora, parte desses dados, enviados para os controladores em Terra, revelam novas informações sobre aquele distante e rochoso mundo.

No em fevereiro, a JAXA completou uma complicada manobra de aterrissagem para coletar amostras do material da superfície e ambiente do Ryugu, a qual será trazida de volta à Terra e aterrissará por aqui no final de 2020. Surpreendentemente, os dados já obtidos até agora estão deixando diversos cientistas com as cabeças quentes.

Uma esfera colorida multi texturizada áspera em um fundo branco
A câmera de luz visível e um espectrômetro de infravermelho próximo na Hayabusa 2 confirmaram a falta de água no Ryugu. Pesquisadores disseram que não tinham certeza de como o corpo dos pais que produziu Ryugu ficou tão desidratado. (Crédito: Seiji Sugita et al., Science)

Acontece que desde a chegada ao Ryugu, em junho de 2018, a Hayabusa 2 além de coletar a amostra também tirou fotos e realizou medições sobre a composição da superfície do asteroide. As primeiras análises dos dados foram apresentadas, neste 19 de março, na “46th Lunar and Planetary Science Conference”, realizada em The Woodlands, Texas, Estados Unidos, segundo informou a New Scientist.

E essas novas informações da espaçonave Hayabusa 2 são o foco de três novos estudos, que foram publicados também em 19 de março, na Science. Alguns dados já revelaram que por lá parece não ter quase nada de água. O Ryugu é uma rocha espacial estranhamente seca.

O formato do pião e a crista equatorial do asteroide sugerem que ele pode ter girado cerca de duas vezes mais rápido do que agora, completando uma volta em menos de quatro horas. Ele pode ter gradualmente reduzido a velocidade de rotação devido a energia do sol que o atinge, diz o membro da equipe Seiji Sugita, da Universidade de Tóquio.

As medições feitas pela Hayabusa 2 também mostraram que a superfície do Ryugu é bastante uniforme. É extremamente escuro, refletindo menos de 2% da luz que o atinge. As comparações com os meteoritos que coletamos na Terra, que foram aquecidos quando passaram pela nossa atmosfera, mostram que as cores combinam, sugerindo que o asteroide foi aquecido no passado. Essa constatação fez os especialistas considerarem a hipótese que o asteroide poder ter sido aquecido quando se separou de um outro asteroide.

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“Apenas alguns meses depois de recebermos os primeiros dados, já fizemos algumas descobertas tentadoras”, disse Seiji Sugita, principal autor de um dos estudos e pesquisador da Universidade de Tóquio, em um comunicado. “O principal é a quantidade de água, ou falta dela, que Ryugu parece possuir. É muito mais seco do que esperávamos, e dado que Ryugu é bastante jovem (para os padrões de asteroides), em torno de 100 milhões de anos, isso sugere o corpo do asteroide-mãe também estava muito desprovido de água”.

Uma rocha de dois outros asteroides

Os cientistas defendem que o Ryugu se formou a partir de um corpo muito maior que continha gelo de água e moléculas orgânicas. No entanto, não está claro como o corpo-pai ficou tão desidratado, disse no comunicado. Uma possível explicação é que este corpo foi aquecido internamente por materiais radioativos que o removeram da maior parte de sua água, disse um dos novos estudos.

Alternativamente, o corpo dos pais pode ter sofrido um bombardeio prolongado por outros corpos rochosos. Imagens do Ryugu revelaram grandes rochas e crateras de impacto em toda a superfície, de acordo com o estudo.

Os pesquisadores confirmaram a relativa falta de água de Ryugu — ou, mais especificamente, minerais hidratados — usando a câmera de luz visível e o espectrômetro de infravermelho próximo da sonda Hayabusa 2. Esta foi uma descoberta surpreendente, pois acredita-se que a água da Terra tenha vindo de asteroides.

Assim, as novas descobertas poderiam ajudar os cientistas a entender melhor a composição química do sistema solar primitivo e os materiais que eram essenciais para a vida quando a Terra se formou, disse o comunicado.

Imagem do asteroide Ryugu capturada pela Câmera de Navegação Óptica-Telescópica (ONC-T) da espaçonave Hayabusa 2 da JAXA, obtida em 26 de junho de 2018.
Esta imagem do asteroide Ryugu foi capturada pela Câmera de Navegação Óptica-Telescópica (ONC-T) da espaçonave Hayabusa 2 da JAXA em 26 de junho de 2018, a uma distância de 22 km. (Crédito da imagem: JAXA / Universidade de Tóquio / Universidade de Kochi / Universidade de Rikkyo / Universidade de Nagoya / Instituto de Tecnologia de Chiba / Universidade de Meiji / Universidade de Aizu / AIST.)

“Isso tem implicações para a busca da vida. Há incontáveis sistemas solares por aí e essa procura por vida além da nossa precisa de um norte”, disse Sugita em no anúncio. “Nossas descobertas podem refinar modelos que podem ajudar a limitar os tipos de sistemas solares que a busca pela vida deve mirar”.

Os novos dados também mostram que o Ryugu tem uma forma oblata (achatada nos polos. Isso sugere que o corpo rochoso pode ter girado duas vezes a sua taxa atual, de acordo com um dos três estudos, liderado por Sei-ichiro Watanabe da Universidade de Nagoya, Japão, e do Institute of Space and Astronautical Science (ISAS), da JAXA.

O terceiro estudo investigou a composição de Ryugu e descobriu que os minerais hidratados estavam disseminados na superfície do asteroide, embora os outros estudos deixem claro que não são abundantes. Além disso, o estudo sugeriu que o aquecimento de eventos climáticos espaciais pode explicar a falta de água no Ryugu.

O asteroide Bennu, que a missão OSIRIS-REx da NASA está explorando, também tem uma forma de “pião”. No entanto, os pesquisadores descobriram evidências de abundantes minerais hidratados em Bennu — muito mais do que o Ryugu abriga.

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A espaçonave japonesa Hayabusa 2 (cuja sombra é visível no topo da imagem) tirou esta foto do asteroide Ryugu em 22 de fevereiro, cerca de um minuto depois de tocar em sua superfície e depois levantar novamente. (Crédito da imagem: JAXA / Universidade de Tóquio / Universidade de Kochi / Universidade de Rikkyo / Universidade de Nagoya / Instituto de Tecnologia de Chiba / Universidade de Meiji / Universidade de Aizu / AIST.)

“Graças às missões paralelas de Hayabusa 2 e OSIRIS-REx, podemos finalmente abordar a questão de como esses dois asteroides se tornaram o que são”, disse Sugita no comunicado. “O fato de que Bennu e Ryugu possam ser irmãos e ainda exibir alguns traços notavelmente diferentes implica que deve haver muitos processos astronômicos emocionantes e misteriosos que ainda precisamos explorar”.

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