Estudo afirma que o infanticídio não era amplamente praticado pelos gregos antigos

Letícia Silva Jordão
Imagem: Pintura de Jean-Pierre Saint-Ours, intitulada “A Seleção das Crianças em Esparta”

A prática grega do infanticídio, onde bebês que nasciam fracos, deficientes ou infermos eram mortos, foi muito propagada pelo passar dos anos, mas se provou ser mentira a partir de um novo estudo publicado na revista Hesperia do JSTOR, onde a autora do estudo, Debby Sneed, mostra que a lenda do infanticídio grego é puro mito ou propaganda.

Debby é professora de clássicos na Universidade do Estado da Califórnia, e diz que seu artigo “[…] confronta a suposição generalizada de que a deficiência, em qualquer sentido amplo e indefinido, constituiu motivo válido para o infanticídio na Grécia antiga”. 

Ela argumenta que o abandono de bebês com deficiência não era uma atitude que recebia a aceitação da sociedade grega antiga, mas reconhece que ocasionalmente isso poderia acontecer.

O mito grego infanticídio

O mito de que os gregos antigos praticavam o infanticídio surgiu a partir da biografia da Vida de Licurgo, escrita pelo filósofo grego Plutarco por volta de 100 d.C. Ele fala que os antigos espartanos realizavam inspeções nos recém-nascidos por um conselho de anciões, que verificava se os bebês eram fortes e em forma para decidir se teriam permissão de viver. Se eles não estiverem nessa condição e se mostrassem mais fracos ou deformados, eram abandonados para se defender sozinhos.

Esse mito acabou gerando diversos danos na história, como podemos ver com os nazistas e a sua incessante busca pela raça perfeita, sendo que ele foi citado diversas vezes por professores e estudiosos modernos ao criar uma narrativa que comparava a evolução social ao longo de 2.000 anos desde a publicação da obra de Plutarco, mas isso poderia ter sido apenas uma forma de fazer propaganda.

Debby Sneed reconhece que o infanticídio era praticado na Grécia antiga, e ainda pode ser em outras sociedades modernas, mas o fato de ser uma prática ampla e popularmente aceita entre as civilizações é puro mito.

Sneed mostra diversas evidências históricas que apoiam sua teoria, como as outras obras que Plutarco escreveu, onde ele fazia referência a um rei espartano que nasceu coxo e deficiente, mas se tornou um líder competente.

Sociedades antigas tinham atitudes mais positivas

No artigo, a professora também aborda sobre o fato do corpo de 400 bebês terem sido descobertos em um vala em Atenas. Essa descoberta foi feita em 2015, e depois de analisar os vetígios em 2018, foi demonstrado que os bebês possuíam poucos dias de vida e tinham padrões consistentes com a alta mortalidade infantil no mundo antigo, onde um bebe morre logo ao nascer de causas naturais, diferente do infanticídio.

Mas, segundo Christian Laes, classicista da Universidade de Manchester, a falta de evidências não indica que o infanticídio não foi praticado. Atualmente, a sociedade tem um grande sentimento de vergonha e desconforto com esse tipo de ato, mas nas civilizações mais antigas, quando existiam tempos de dificuldades econômicas e problemas como seca e fome, existem altas incidências da mortalidade infantil.

Após ter publicado seu artigo, Debby Sneed pediu uma reinterpretação das obras de Plutarco e outros filósofos contemporâneos que escreveram sobre o infanticídio, já que essa narrativa pode mostrar a visão erronea de que as sociedades sempre tiveram atitutes negativas com pessoas que apresentavam alguma deficiência, quando na verdade, em sociedade pré-modernas, as pesoas antigas mostravam uma atitute mais positiva na maioria dos casos, onde se buscava ajudar e cuidar dos cidadãos, ao invés de abandoná-los.

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