Estudo genético massivo mostra como os seres humanos estão evoluindo

Rafael Coimbra
Ira Block / NGC

Ampla análise de DNA, que pesquisou o material genético de 215.000 pessoas, sugere que as variantes que encurtam a vida estão sendo selecionadas.

De Bruno Martin para a Nature 1

Um enorme estudo genético que buscou identificar como o genoma humano está evoluindo sugere que a seleção natural está se livrando de mutações genéticas nocivas que reduzem a vida das pessoas. O trabalho, publicado na PLoS Biology 2 , analisou o DNA de 215 mil pessoas e é uma das primeiras tentativas de investigar diretamente como os seres humanos estão evoluindo ao longo de uma ou duas gerações.

Para identificar quais fragmentos do genoma humano podem estar evoluindo, os pesquisadores vasculharam grandes bancos de dados genéticos dos Estados Unidos e do Reino Unido em busca de mutações cuja prevalência variou em diferentes faixas etárias. Para cada pessoa, a idade da morte dos pais foi registrada como uma medida de longevidade, ou a idade de morte do próprio pesquisado em alguns casos.

“Se uma variante genética influencia a sobrevivência, sua frequência deve mudar com a idade dos indivíduos sobreviventes”, diz Hakhamanesh Mostafavi, biólogo evolucionista da Universidade de Columbia, em Nova York, que liderou o estudo. As pessoas que carregam uma variante genética nociva morrem a uma taxa mais alta, então a variante torna-se mais rara na porção mais antiga da população.

Mostafavi e seus colegas testaram mais de 8 milhões de mutações comuns e encontraram duas que pareciam se tornar menos prevalentes com a idade. Uma variante do gene APOE , que está fortemente ligada à doença de Alzheimer, raramente foi encontrada em mulheres com mais de 70. E uma mutação no gene CHRNA3 associado ao tabagismo pesado em homens extinguiu-se aos poucos na população a partir da idade média. As pessoas sem estas mutações têm uma vantagem de sobrevivência e são mais propensas a viver mais, sugerem os pesquisadores.

Isso não é, por si só, evidência da evolução trabalhando. Em termos evolutivos, ter uma vida longa não é tão importante como ter um resultado reprodutivo profícuo, com muitas crianças que sobrevivem até a idade adulta e geram seus próprios descendentes. As mutações nocivas que exercem os seus efeitos após a idade reprodutiva podem ser “neutras” nos olhos da evolução e não terem sido selecionadas.

Mas se fosse esse o caso, haveria muitas dessas mutações que continuariam a circular no genoma, argumentam os autores. Um estudo tão grande descobriu que apenas duas mutações sugerem fortemente que a evolução está “as eliminando”, diz Mostafavi, e que outras provavelmente já foram expurgadas da população por seleção natural.

Links para a longevidade

Por que essas mutações de atuação tardia podem diminuir a aptidão genética de uma pessoa — sua capacidade de reproduzir e espalhar seus genes — continua a ser uma questão aberta.

Os autores sugerem que, para os homens, pode ser que aqueles que vivem mais possam ter mais filhos, mas é improvável que isso seja a história toda. Então, os cientistas estão considerando duas outras explicações sobre por que a longevidade é importante. Primeiro, os pais que sobrevivem à velhice em boa saúde podem cuidar de seus filhos e netos, aumentando as chances das gerações posteriores de sobreviver e reproduzir. Isso às vezes é conhecido como a “hipótese da avó”, e pode explicar por que os seres humanos tendem a viver muito depois da menopausa.

Encontrar isso em seres humanos é realmente muito legal. Eu acho que é um estudo muito bom.”Jonathan Pritchard, geneticista da Stanford University, na Califórnia

Em segundo lugar, é possível que as variantes genéticas que são explicitamente ruins na velhice também sejam prejudiciais — mas mais sutilmente — no início da vida. “Você precisaria de amostras extremamente grandes para ver esses pequenos efeitos”, diz Iain Mathieson, geneticista de população na Universidade da Pensilvânia, na Filadélfia, por isso não é possível ainda saber se esse é o caso.

Os pesquisadores também descobriram que certos grupos de mutações genéticas, que individualmente não teriam um efeito mensurável, mas que, juntos, representavam ameaças para a saúde, apareceram menos frequentemente em pessoas que eram esperadas ter uma boa longevidade em relação àquelas das quais não se esperava boa longevidade. Estes grupos incluíam predisposições à asma, alto índice de massa corporal e colesterol elevado. O mais surpreendente, no entanto, foi a descoberta de que conjuntos de mutações que atrasam a puberdade e a gravidez são mais prevalentes em pessoas de vida longa.

Ver uma conexão genética que atrasa a idade fértil é intrigante, diz Jonathan Pritchard, geneticista da Universidade de Standford na Califórnia. O vínculo entre longevidade e fertilidade tardia já havia sido detectado antes, mas esses estudos não poderiam descartar os efeitos da riqueza e da educação, já que as pessoas com níveis elevados de ambos tendem a ter filhos mais tarde na vida. Essa última evidência genética fez Pritchard pensar que existe um intercâmbio evolutivo entre fertilidade e longevidade, que já havia sido estudado apenas em animais. “Encontrar isso em seres humanos é realmente muito legal”, diz ele. “Eu acho que é um estudo muito bom”.

Estudar a evolução contínua em seres humanos é notoriamente difícil. Os cientistas que querem observar diretamente a seleção precisam medir a frequência de uma mutação em uma geração e, novamente, em todas as crianças dessa geração e, melhor ainda, nos netos, diz Gil McVean, geneticista estatístico da Universidade de Oxford, no Reino Unido. “Isso seria muito difícil de se fazer bem feito”, diz ele. “Você precisaria de grandes amostras”.

Referências:

  1. Bruno Martin. Massive genetic study shows how humans are evolving. Nature, 06 de setembro de 2017. <http://www.nature.com/news/massive-genetic-study-shows-how-humans-are-evolving-1.22565> Acesso em 07 de setembro de 2017;
  2. Mostafavi, H. et al. Identifying genetic variants that affect viability in large cohortsPLoS Biol. 15, e2002458 (2017). <https://doi.org/10.1371/journal.pbio.2002458>
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